Conta esta lenda judaica que dois amigos cultivavam e dividiam o mesmo campo de trigo,
trabalhando arduamente a terra com amor e dedicação, numa luta estafante, às
vezes inglória, à espera de um resultado compensador.
Anos a fio lidaram com a terra, obtendo pouco ou nenhum retorno, até que um
dia, finalmente, a natureza respondeu e regalou-os com uma grande safra, perfeita, magnífica, satisfazendo os
dois agricultores que a repartiram igualmente, eufóricos.
Trabalharam na colheita o dia inteiro e depois cada um seguiu o seu
rumo.
À noite, já no leito, cansado da brava lida daqueles
últimos dias, um deles pensou: "Eu sou casado, tenho filhos fortes e bons,
uma companheira fiel e cúmplice. Eles me ajudarão no fim da minha vida. O meu
amigo é sozinho, não se casou, nunca terá um braço forte a apoiá-lo. Com
certeza, vai precisar muito mais do dinheiro da colheita do que eu".
Levantou-se silencioso para não acordar ninguém, colocou
metade dos sacos de trigo recolhidos na carroça e saiu.
Ao mesmo tempo, em sua casa, o outro não conciliava o
sono, pensando: "Para que preciso de tanto dinheiro se não tenho
ninguém para sustentar, já estou idoso para ter filhos e não penso mais em me
casar? As minhas necessidades são muito menores do que as do meu sócio, com uma
família numerosa para manter".
Não teve dúvidas: pulou da cama, encheu a sua carroça com
a metade do produto da boa terra e saiu pela madrugada fria, dirigindo-se à
casa do outro. O entusiasmo era tanto que não dava para esperar o amanhecer.
Na estrada escura e nebulosa daquela noite de inverno, os
dois amigos encontraram-se frente a frente. Olharam-se espantados. Mas não
foram necessárias as palavras para que entendessem a mútua intenção.
Amigo é aquele que no seu silêncio escuta o silêncio do
outro.
(Lenda Judaica)
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